Centenas de milhares assinaram manifesto pela libertação
Leonardo Wexell Severo


Após 36 anos de cárcere – 12 dos quais em solitária – o preso político mais antigo do mundo, o lutador pela independência de Porto Rico, Óscar López Rivera, será colocado em liberdade pelo governo dos Estados Unidos no final de maio. Até lá, mesmo aos 74 anos, continuará sendo obrigado a realizar trabalhos forçados.

 
Desde que os EUA invadiram e ocuparam militarmente a Ilha caribenha em 1898, tal qual belo pássaro, o país foi engaiolado. Porto Rico, a “asa que caiu no mar”, como cantou Pablo Milanés, acabou sendo reduzido a uma colônia norte-americana, “estado livre associado” com cidadãos de segunda categoria, sem poder votar nas eleições presidenciais e sequer ter representação em Washington. Ainda sim, os conglomerados de mídia acusam os independentistas de        “separatistas”, como se estivessem condenados a tal “união” para todo o sempre.

 
Após uma intensa campanha internacional, em 2012 o Comitê de Descolonização da ONU (Organização das Nações Unidas) aprovou uma resolução, apresentada por Cuba, defendendo o reconhecimento ao direito à independência e à autodeterminação de Porto Rico e conclamando à libertação dos independentistas prisioneiros nos EUA. Da mesma forma que fez e faz em relação a toda e qualquer decisão contrária a seus interesses, o império do Norte ignorou olimpicamente a resolução.
 
Ao lado de 14 companheiros, Óscar López Rivera foi condenado em fevereiro de 1981 sob a acusação de “conspiração sediciosa” por integrar uma organização chamada “Forças Armadas de Libertação de Porto Rico”, que buscava a soberania da nação. Encarcerado, se declarou “prisioneiro de guerra”, amparado na Convenção de Genebra, já que a resistência popular sempre esteve relacionada à luta anti-colonial. A reclamação foi ignorada pelo governo norte-americano, que o condenou – sem qualquer prova – a 55 anos de prisão federal, aos quais foram acrescidos mais 15 por suposta “tentativa de fuga”, convertendo a sentença em 70 anos de cárcere.
 
Uma boa parte deste tempo, como lembrou Rivera em sua carta à neta Karina, em “ADX, a prisão de segurança máxima de Florence, projetada para os piores criminosos dos Estados Unidos, considerada a mais forte e mais difícil de penetrar em todo o país”. Estelabirinto de aço e concreto, construído para isolar e incapacitar” só tem sentido, denunciou, porque “hoje a indústria penitenciária é uma das mais poderosas nos EUA. Ela faz dinheiro, e isso parece ser a única coisa que importa”.
ABRAÇANDO A CAUSA
 
O jovem que chegou a ser condecorado por bravura durante sua atuação no Vietnã, retornou da guerra e começou a denunciar as condições degradantes a que eram submetidos os seus compatriotas nos EUA, logo vindo a abraçar a causa independentista. Em Chicago, onde vivia com sua família desde os 14 anos, dedicou-se à luta comunitária contra a violência policial, por melhorias na saúde, educação e moradia, participando de atos pacíficos de desobediência civil. Posteriormente, em 1976, passou à clandestinidade – única forma de levar adiante a luta pela libertação, diante da crescente repressão imposta pela CIA e pelo FBI. Em 1981 é capturado.
Ao longo de sua trajetória, todos reconhecem uma inquebrantável coerência, determinação e compromisso com os princípios. Um dos muitos exemplos é que em 1999, em solidariedade a outros dois prisioneiros que não seriam libertados, e por não aceitar condições adicionais impostas a ele, López Rivera recusou a “clemência” oferecida pela presidência. Nas palavras do patriota, seria como “continuar na prisão fora da prisão”.
 
Entre as desumanas condições a que López Rivera foi submetido, testemunhou a ex-presa política Alícia Rodríguez, era obrigado a dormir com um braço e uma perna para fora da grade, por exigência dos carcereiros, para que soubessem que estava dentro da cela. “Durante mais de uma década sequer pude tocá-lo. De 1986 a 1998, ficávamos separados por um vidro, sem contato físico, num pequeno espaço, com ele algemado nas mãos e nos pés e cercado por quatro guardas”, recordou Clarissa López Ramos, sua única filha.
O ex-presidente do Colégio de Advogados de Porto Rico, Eduardo Villanueva, disse estar “profundamente agradecido pela unidade, constância e valor” com que seus compatriotas assumiram a batalha pela libertação de López Rivera, enaltecendo em especial a postura de Cuba, Nicarágua, Bolívia e Venezuela, cujos governos tanto contribuíram para esta vitória. “Oscar López Rivera forma parte daqueles homens e mulheres que nos dão lições ao serem capazes de dar tudo por um ideal de justiça”, enfatizou.
Em defesa da libertação do patriota porto-riquenho se manifestaram personalidades como o arcebispo sul-africano Desmond Tutu; o atual governador da Ilha, Ricardo Rosselló; o senador estadunidense Bernie Sanders, artistas como Calle 13, Ricky Martin e Rubén Blades, e inúmeras lideranças políticas, intelectuais e sociais de  todo o mundo.
Como relatou orgulhosa sua filha Clarissa, “olho nos olhos do meu velho e vejo que o amor pela igualdade, pela justiça e a independência de Porto Rico estão intactos. Sei que para ele não foi um sacrifício, que ele só fez o que lhe ditou o coração e a consciência para que vivamos em um país livre”.

 

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