“Aprovaram um projeto mentiroso de ‘Fome Zero’ que não garante nem almoço nem merenda escolar universal, além de comprometer recursos da saúde”, denuncia a dirigente oposicionista, condenando o “atropelo à democracia”

Líder da Frente Guasú, Esperanza Martínez afirma que os recursos viabilizados a partir de 2013 pelos presidentes Fernando Lugo e Lula, com maior repasse arrecadado com Itaipu, foram desvirtuados pelo atual governo do Paraguai (SenadoPy)

A senadora Esperanza Martínez, líder da Frente Guasú, condenou a forma atabalhoada, desrespeitosa e de “atropelo à democracia” com que o presidente Santiago Peña atacou o Fundo Nacional de Investimento Público e Desenvolvimento (Fonacide), e retirou, com a anuência do parlamento, recursos da saúde e da educação. “Tudo sob o pretexto de aprovar um projeto mentiroso com o nome de ‘Fome Zero’, utilizado como atrativo para enganar”, esclareceu.

O Ministério da Educação afirmou que será suprimida a merenda escolar“cujo valor nutricional não contribui muito” e passará a ser fornecido tão somente o almoço, que supostamente alcançaria 1,3 milhões de crianças e adolescentes durante os 180 dias do ano letivo.

Conforme dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), a fome e a insegurança alimentar seguem sendo uma realidade desoladora no Paraguai, afetando uma entre quatro famílias (25%). Apesar disso, o governo continua priorizando o escandaloso enriquecimento da agropecuária, dominado por transnacionais como Bayer/Monsanto, Bunge e Cargill, e a exportação de alimentos para 80 milhões de pessoas.

Na avaliação da dirigente oposicionista, “não se trata de uma política de universalização de direitos, pois não abrangerá a todas os estudantes, todos os dias, com almoço e merenda”. Embora limitados atualmente, ressaltou Esperanza, os recursos da alimentação escolar vinham sendo financiados pelo Fonacide.

Em segundo lugar, explicou, “se retira a responsabilidade dos ministérios da Educação e da Saúde, que quase não aparecem na implementação deste projeto, algo que é muito grave”.  “Em terceiro lugar, o almoço e a merenda escolar, que estavam sob a responsabilidade de mais de 300 municípios e 17 governos estaduais, passam a ficar no Ministério da Economia concentrando as licitações. Serão centenas de milhões de dólares em poucas mãos”, acrescentou.

CONQUISTA DOS PARAGUAIOS SOB ATAQUE

Negociado pelos presidentes Lula e Fernando Lugo, o Fonacide permitiu ao Paraguai receber maior compensação pelos recursos arrecadados com o repasse de Itaipu, que foram elevados de cerca de US$ 116 milhões para US$ 360 milhões anuais. “Isso se transformou em 2013 numa lei que se chama Fonacide, que financia várias questões, como o Fundo de Financiamento da Educação – com apoio a cientistas e pesquisadores -; tem a ver com a ‘Tarifa Zero’, a educação universitária; também diz respeito ao financiamento à Lei Nacional de Saúde Mental, aos medicamentos oncológicos (para o câncer) e ao programa de transplante”, explicou Esperanza. Ou seja, ”uma série de recursos fundamentais para a saúde e educação ficarão comprometidos”.

Entre as perdas para a democratização e descentralização da gestão pública, identifica Esperanza Martínez, estão a absurda retirada da gestão dos recursos administrada por governos da oposição, do Partido Liberal, “o de Central – que é o maior, com quase 40% dos habitantes – e o de Itapúa”. “Também foi retirada a gestão do governo de Presidente Hayes, que embora sendo do Partido Colorado, é de uma linha contrária ao setor cartista [do ex-presidente Horácio Cartes], que é o oficialista neste momento”, disse.

Além disso, descreveu a senadora, foram criadas uma série de dificuldades técnicas, em prol de uma política ultraconservadora: “são revogadas sete ou oito leis financiadas pelo Fonacide e que ficarão sem proteção legal, ao arbítrio dos ministros da Economia de turno, que poderão ou não liberar os recursos, tudo conforme sua conveniência”. E alertou: “há muito temor de avançarmos rumo a um modelo autoritário, como o da ditadura strossnista [sustentado pelos EUA, o general Alfredo Stroessner governou o Paraguai entre 1954 e 1989]. Sem debate, sem diálogo, há risco de um retrocesso democrático depois de 35 anos de um modelo que pensávamos superado”.

“Dizendo de uma forma simples: o governo tem um montante que não alcança para todos e vai focalizar supostamente nos mais vulneráveis e não vai assegurar as duas refeições, como é necessário”, condenou a ex-ministra da Saúde. “Sempre é preferível investir na merenda escolar, para que a criança possa comer algo na metade da manhã ou da tarde, a fim de que isso lhe ajude no processo de atenção, de estudo, no desenvolvimento das suas capacidades cognitivas, porque sabemos que com fome não se aprende”. Garantida a primeira refeição, esclareceu, se faz necessário avançar para universalizar o almoço escolar.

Diante dos ataques governistas, a senadora convocou uma audiência pública para esta quinta-feira (11) com o intuito de “garantir a continuidade, financiamento e execução de programas estratégicos ligados à saúde, educação, pesquisa, primeira infância e estabelecer obrigações para o Ministério da Economia e Finanças”.

LEONARDO WEXELL SEVERO/Hora do Povo

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