Democratização da comunicação na ordem do dia
Evento reuniu mais de 100 meios alternativos de 14 países

Monica Fonseca Severo, de Vallegrande-Bolívia
O Encontro Latino-americano de Comunicadores Anti-imperialistas reuniu representantes de mais de 100 meios alternativos de 14 países em Vallegrande, na Bolívia, de 6 a 9 de outubro, como parte das comemorações dos 50 anos da presença de Ernesto Che Guevara no país.
Em meio a intensos debates, os participantes propuseram a criação de uma rede de comunicação solidária, como forma de fortalecer a luta contra a desinformação veiculada pelos meios hegemônicos de comunicação. Para concretizar a reivindicação, entregaram ao presidente Evo Morales a proposta de criação de uma escola de formação para os comunicadores comprometidos com a ação anticolonialista, solidária, aquela que defende a autodeterminação dos povos.

Enfrentamento aos oligopólios midiáticos necessita de apoio e de recursos
Para José Aramayo, diretor do Portal Resumen Latinoamericano, “os comunicadores alternativos, que fazem um trabalho comunitário, que têm compromisso com o povo, têm que superar o fato de atuarem como pequenas ilhas”. “Para termos voz, precisamos construir em nosso continente uma política de comunicação em que atuemos unidos, integrados. Somente desta forma poderemos fazer frente aos grandes meios”, ressaltou o jornalista.
Diversos casos em que a mídia comercial invisibiliza os movimentos sociais, assim como criminaliza sua luta, foram relatados. Entre eles o “desaparecimento” de Santiago Maldonado, militante que apoiava a luta dos mapuches argentinos, sequestrado pelo governo Macri; a perseguição aos dirigentes mapuches no Chile, pelo governo Bachelett; inúmeros sequestros e assassinatos de lideranças populares e estudantis no México assim como a prisão criminosa de camponeses paraguaios de Curuguaty, que lutam pela reforma agrária.
EMANCIPAÇÃO
Amanda Dávila, ex-ministra de Comunicação da Bolívia, conclamou os presentes a seguirem o exemplo de Che. “Em vão a CIA e seus esbirros disseram que Che era cruel, que não tinha apoio. Em vão o enterraram em uma vala comum. Ele não está em Santa Clara, ele permanece vivo. Para nós, seguirá sendo o irmão latino-americano que nos mostra que é digno morrer por um mundo melhor”, afirmou Amanda. A ex-ministra lembrou que Che, ainda na Sierra Maestra, já demonstrava uma profunda compreensão da necessidade de travarmos a luta também no campo das ideias. “Devemos nos inspirar na ação de Che como jornalista, precisamos investigar a realidade para lutar também com a caneta, com a máquina fotográfica, que também são armas. Em 1957, o comandante levou mimeógrafo, stencil, tinta e papel para a Sierra Maestra, diante da admiração dos demais guerrilheiros. São as armas da guerra de palavras. Depois da vitória em Cuba, Che, Fidel e Jorge Ricardo Masetti criaram a agência informativa Prensa Latina, para disputar espaço com as agências comprometidas com o grande capital”, relatou Dávila. “Diante do cerco midiático que enfrentamos, diante da ação dos que tentam estrangular nossos processos de emancipação, é preciso retomar este exemplo. A hegemonia na comunicação é o maior instrumento dos grandes conglomerados na guerra que travamos neste momento. Precisamos romper este cerco, difundindo e desenvolvendo estratégias de propaganda, anunciando nossos avanços sem esconder os riscos e perigos que enfrentamos”, afirmou Amanda..“Sabemos que a imparcialidade é um mito, mas devemos buscar reconstruir a realidade da melhor forma que possamos. Reconhecendo que a subjetividade existe e atua na tarefa dos comunicadores, temos que ser fiéis e autênticos, mesmo que a realidade doa”, prosseguiu Amanda, para quem “essa é a diferença entre nós e o poder econômico”. “Temos que trabalhar com a verdade, pois ela está ao nosso lado. Defendemos o direito de cada povo construir seu destino. Nosso compromisso é o de que os recursos naturais de nossa nação sirvam ao povo, e não à banca mundial e aos especuladores”, afirmou Dávila. Sobre a política implementada no país vizinho de garantir 33% do espectro de rádio para as comunidades, a ex-ministra ressaltou que “já demos o microfone para que as pessoas falem, mas isso não basta. É preciso capacitar tecnicamente esses comunicadores”. “Na Bolívia já temos uma nova ordem política e econômica, porém não construímos ainda uma nova ordem na comunicação”, constatou Dávila, que conclamou os presentes a fazê-lo, em todo o continente.
Os grandes meios de comunicação, que estão fortemente vinculados à casta que controla as riquezas no planeta, precisam distribuir ideias que façam a dominação parecer plausível, necessária e lógica. Para fazer frente a esta farsa, ao final do evento, os presentes aprovaram uma declaração conjunta, exortando os comunicadores a atuarem de forma mais integrada para enfrentarem em melhores condições a disputa política e ideológica. Entre os pontos do documento, destacam-se a criação da Escola Ernesto Che Guevara de Comunicação, uma escola online de formação para comunicadores sociais que deverá oferecer formação online; o fortalecimento dos instrumentos de integração já gestados, como a ALBA e a UNASUL; articulando um espaço em que a comunicação seja livre e que garantia que todas as vozes possam se fazer ouvir.
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