Marcela Arellano Villa condena ataques do governo Noboa à soberania e aos direitos sociais e trabalhistas dos equatorianos (LWS)

Presidenta da Confederação das Organizações Sindicais Livres do Equador, Marcela Arellano Villa, condena proposta de “arbitragem internacional” colocada pelo governo na Consulta Popular no próximo dia 21. “É para nos submetermos a cenários controlados por empresas transnacionais e seus lobistas”, denunciou a dirigente

A presidenta da Confederação das Organizações Sindicais Livres do Equador (Cesol) e dirigente da Federação Unitária dos Trabalhadores (FUT), Marcela Arellano Villa, condena o Plano Fênix e o projeto de Consulta Popular apresentado por Daniel Noboa para o próximo 21 de abril como complementares no atentado à soberania nacional e aos direitos sociais e trabalhistas. Em entrevista exclusiva ao HP, Marcela alerta que se por um lado “nenhum capo foi capturado e a violência criminal e a violência estatal continuam crescendo”, por outro a Consulta aponta para medidas como “a arbitragem internacional”, que equivale a “colocar o laço no pescoço” dos equatorianos. “É a perda da soberania nacional para nos submetermos a cenários controlados por empresas transnacionais e seus lobistas”, acrescentou.
LEONARDO WEXELL SEVERO/ Hora do Povo

Por meio do ‘Plano Fênix’, com as Forças Armadas atuando em conjunto com a Polícia Nacional, o presidente Daniel Noboa prometeu acabar com a violência no Equador. Apesar do estado de exceção, os sequestros e extorsões se multiplicam, quintuplicando no caso de Guayaquil. Como avalias esta dura realidade?

O Equador vive um momento muito complexo de aprofundamento da crise de insegurança em que a violência criminal, juntamente com a violência estatal, continua crescendo. Isso apesar da declaração de conflito armado interno de 9 de janeiro passado, que ocorreu em resposta a uma série de atentados, incluindo a tomada de controle de um canal público de televisão e a fuga da prisão de líderes do crime organizado.

Segundo informações do governo, a implementação do Plano Fênix​​resultou na prisão de mais de 16 mil pessoas e na realização de 200 mil operações, sendo que os processados ​​representam 1,7% do total dos presos.

Até o momento não há nenhum capo (chefão) capturado, a violência criminosa continua aumentando, como os assassinatos recentes, entre os quais o da prefeita de São Vicente – a mais jovem do país – e de seu assessor de comunicação. Na prática, a guerra é travada contra pessoas jovens, pobres, afrodescendentes e migrantes.

Nada é feito para romper os vínculos entre o crime organizado e o Estado, não é tomada nenhuma providência para combater a lavagem de dinheiro feita através do sistema financeira, das mineradoras e agroindústrias”

Com profunda indignação observamos que nada é feito para romper os vínculos entre o crime organizado e o Estado, não é tomada nenhuma providência para combater a lavagem de dinheiro feita através do sistema financeiro, das mineradoras e agroindústrias.

Em que medida esta lógica repressiva impacta as relações sociais e trabalhistas? Como a população está vendo isso?

Do ponto de vista das organizações sindicais e sociais, a declaração de guerra garante a implementação da agenda do “livre mercado”. O governo Noboa alcançou um consenso importante com os grupos econômicos, os meios de comunicação tradicionais e o parlamento.

Foi assegurado um consenso legislativo com o Partido Social Cristão, o Revolução Cidadã e vários independentes, um acordo que permitiu ao governo, durante os seus 100 primeiros dias, aprovar cinco reformas legais. São reformas que garantem a proteção dos interesses dos grupos econômicos que agora controlam o governo equatoriano.

A reforma tributária perdoou mais de US$ 1,6 bilhão aos bancos e às mineradoras; a abertura de zonas francas põe em risco os direitos trabalhistas e a liberdade de associação, houve a abertura à privatização de empresas públicas e a ratificação dos acordos bilaterais com os Estados Unidos que permitem a militares norte-americanos atuar em território equatoriano e de Tratado de Livre Comércio (TLC) com a China. Da mesma forma, o aumento do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de 12% para 15% terá um impacto negativo no emprego, na produção e no consumo de uma população que já está vivendo na pobreza e na miséria.

O estado de guerra é usado para proteger as mineradoras e violar os direitos e violentar as vidas dos camponeses e trabalhadores”

Por outro lado, os militares e a polícia que têm o mandato de combater o crime, neste exato momento estão reprimindo as comunidades de Cotopaxi, que se opõem à mineração. Durante a violenta incursão dos militares na comunidade Palo Quemado, o estado de guerra é usado para proteger as mineradoras e violar os direitos e violentar as vidas dos camponeses e trabalhadores.

Atualmente não é possível desenvolver ações sindicais na agroindústria e na mineração no Equador. As ameaças de morte por parte de grupos criminosos que protegem esse tipo de capital impedem a defesa dos direitos trabalhistas e sindicais.

Exemplo disso é que em outubro de 2023 tiveram de sair do país três companheiras dirigentes do sindicato bananeiro ASTAC. Os dirigentes sindicais da Energy Palm Company (de óleo de palma) e da Confederação de Organizações Sindicais Livres do Equador (Ceosl) temos sido permanentemente ameaçados para impedir a criação do Comitê de Empresa dos Trabalhadores.

Noboa falou na criação de 160 mil empregos no Equador, mas em dois meses mais de 80 mil pessoas ficaram desempregadas.

Não existe a geração de novos empregos propalada pelo governo e a redução dos filiados à Seguridade Social demonstra isso. A desfiliação de 50 mil pessoas ao Instituto Equatoriano de Seguridade Social (IESS) nos permite assegurar que o desemprego e o subemprego aumentam.

Não existe a geração de novos empregos propalada pelo governo e a desfiliação de 50 mil pessoas ao Instituto Equatoriano de Seguridade Social nos permite assegurar que o desemprego e o subemprego aumentam”

Os dados apresentados pelo Ministério do Trabalho e pelo presidente Noboa sobre a criação de novos empregos estão baseados no registro dos contratos de trabalho e não levam em conta os termos de rescisão de contrato entregues no final do ano, os trabalhadores com contratos precários são retirados da folha de pagamento em dezembro para serem recontratados novamente em janeiro. A informação sobre a criação de novos empregos é falsa.

Qual a sua avaliação sobre a Consulta Popular que Noboa convocou para o próximo 21 de abril?

A consulta popular e o referendo convocados para 21 de abril representa um desperdício de dinheiro, são US$ 60 milhões que o Estado não tem e é mais uma irresponsabilidade por parte de Noboa. Para realizar esta consulta, o Conselho Nacional Eleitoral pediu recursos emprestados às Forças Armadas, instituição com interesses particulares na Consulta.

A consulta popular não resolverá os problemas de segurança, assim como a declaração de guerra (conflito armado interno) não o fez. O crime continua ensanguentando as ruas, os chefões seguem livres, as vidas das pessoas continuam em perigo, permanece a lavagem de dinheiro sujo, se mantém a aliança entre o crime organizado e as autoridades policiais. Enquanto isso, as Forças Armadas protegem as mineradoras, cujo claro exemplo é o caso de Palo Quemado, com a exploração de ouro, prata, cobre e zinco.

Observamos que a consulta popular tem objetivos que não são precisamente a segurança e o cuidado com a vida das pessoas. Para garantir a popularidade do presidente e da sua candidatura para 2025, Noboa continua fazendo campanha e utiliza recursos públicos para isso. A campanha da Consulta é um prelúdio à campanha presidencial.

Como terminado o conflito com o Peru as Forças Armadas tornaram-se uma entidade burocrática, sem funções, que consumia importantes recursos nacionais, era importante dar aos militares o papel central na tomada de decisões políticas de segurança pública.

Querem alterar a estrutura de trabalho e avançar na flexibilização laboral, com inúmeros retrocessos. O contrato por hora e por tempo determinado afetará os direitos dos trabalhadores, especialmente dos jovens e das mulheres, que perderão várias conquistas como: Horas extras e suplementares; Férias e feriados; Estabilidade, impactando no acesso ao crédito, pois quem estiver sob esse regime de trabalho precário não conseguirá programar a sua vida. Deixarão de existir mecanismos que garantam filiação à Seguridade Social; o trabalho por hora e por tempo determinado terá efetivamente impacto na diminuição da produtividade e na perda de mais empregos.

Finalmente, não consta o valor do trabalho por hora. A fim de garantir a vitória na consulta, a ministra do Trabalho menciona em cada entrevista diferentes valores, variando entre US$ 4 e U$ 13. A verdade é que o valor do trabalho por hora irá oscilar entre US$ 1,92 e US$ 3,00.

Qual é o significado para a soberania equatoriana do reconhecimento da “arbitragem internacional” através da Consulta?

Aceitar a arbitragem internacional é colocar o laço no pescoço, é a perda da soberania nacional para nos submetermos a cenários controlados por empresas transnacionais e seus lobistas. Se esta questão for aprovada, no caso Chevron Texaco [em que a transnacional contaminou rios e aquíferos durante décadas, extraindo petróleo do subsolo da selva amazônica] seríamos nós quem teríamos que pagar indenizações à empresa.

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