Eva Golinger: mídia comunitária ajudou a democratizar o país |
Antes da primeira eleição de Chávez, a Venezuela “era um país onde as pessoas se sentiam invisíveis, não se identificavam com seu processo político. Agora é um país onde elas pensam, criticam, debatem, participam”. A afirmação é da jornalista, escritora, advogada e pesquisadora venezuelano-americana, Eva Golinger.
Por Vanessa Silva e Leonardo Severo, de Caracas-Venezuela
Nascida em Nova York e filha de venezuelanos, Eva ganhou o prêmio de Jornalismo do México e ao longo dos anos tem pesquisado a fundo a ingerência dos Estados Unidos na Venezuela e em outros países da América Latina, sendo uma das principais defensoras da revolução boliviariana. Nesta entrevista ao ComunicaSul, a renomada intelectual defende a lisura do processo eleitoral venezuelano e critica a postura dos grandes conglomerados de comunicação – na Venezuela e no estrangeiro – que atuaram abertamente para “desestabilizar o processo”.
A ativista também aponta os avanços conquistados na área da comunicação e ressalta a importância dos meios comunitários na conquista e manutenção da soberania do país.
Equipe do ComunicaSul com de Eva Golinger/ Foto: Márcio Schenatto |
ComunicaSul: Como você avalia a cobertura da mídia no processo eleitoral venezuelano?
Eva Golinger: Há uma campanha já há muito tempo contra a Venezuela e o processo liderado pelo presidente [Hugo] Chávez. Em particular, nesta campanha estiveram tentando desacreditar e deslegitimar o sistema eleitoral do país, apesar dele ter sido reconhecido como o melhor do mundo. Aqui falam que Chávez é beneficiado pelos meios públicos que sempre transmitem os eventos oficiais, mas, ao mesmo tempo, o candidato opositor teve apoio de empresas e de grandes meios privados do país – que na Venezuela são maioria e, sem dúvida, têm mais audiência que os públicos.
Este governo fortaleceu os meios comunitários. Qual a importância que a comunicação alternativa tem para o desenvolvimento do país?
Antes de Chávez não existiam meios comunitários, alternativos, como existem agora. Estavam na clandestinidade, tinham que trabalhar de maneira secreta e não havia nenhum apoio. Não digo nem financeiro, mas apoio moral, político, estratégico. Sob a Constituição da República Bolivariana da Venezuela, aprovada em 1999, cria-se a figura dos meios de comunicação comunitários, como um direito que o Estado tem que apoiar com recursos. Tem outra lei aprovada em 2004 [Lei de Responsabilidade Social no Rádio e na Televisão – Resorte] – que foi muito distorcida pelos meios de comunicação privados. A lei amplia o espaço para a criação de comitês de usuários e usuárias dos meios, para que sempre haja uma auditagem da informação que se está reportando e as comunidades que estão representadas.
E que mudanças substanciais esse processo provocou?
Hoje, diferentemente de 10 anos atrás, quando houve um golpe aqui e os meios de comunicação privados tiveram um papel fundamental [os grandes canais de TV apoiaram o golpe]. Meios comunitários quase não existiam, não tinham força, nem poder e, assim, conseguiram censurar a informação das pessoas. Hoje, isso não pode acontecer. Os meios comunitários não são a maioria, nem têm a maior audiência, mas através da internet, das redes sociais, podem assegurar que sua voz se escute, se expresse, e podem ocupar os espaços que antes não tinham. Os meios comunitários são fundamentais para garantir a soberania do país
Existe um movimento de solidariedade em apoio à Venezuela, como pode ser observado pela quantidade de acompanhantes internacionais que vieram ao país. Como vês isso?
Creio que tem muita mobilização mundial pelo que aconteceu na Venezuela nesses últimos anos, pela transformação social que existe aqui. Apesar de todas as suas falhas e imperfeições, as coisas aqui mudaram muitíssimo. Há muito mais reivindicações de direitos sociais, de direitos econômicos, culturais, inclusive direitos políticos e civis. Então há movimentos mundiais de artistas e intelectuais que apoiam este processo. Há, evidentemente, outros que criticam. E acho bom que, pela primeira vez na história, a Venezuela seja tema de debates, trocas dentro dessas comunidades de artistas e intelectuais a nível mundial. Me fascina que queiram estudar, analisar, que aprendam tanto com as falhas, como com as conquistas. E que logo possam, em seus próprios países, avançar para mais justiça social. Esse é o objetivo principal do que é a Revolução bolivariana.
Na sua avaliação, qual é a maior conquista dessa revolução?
Para mim, a maior conquista é a participação social, seja chavista, da oposição, ou desvinculada, as pessoas estão participando. Não é uma sociedade que tem apatia, mas que participa porque sabem que sua voz tem importância. Eu vivi aqui antes de Chávez ganhar pela primeira vez em 1998 e era outro país. Era um país onde as pessoas se sentiam invisíveis, não se identificavam com seu processo político. Agora é um país onde as pessoas pensam, criticam, debatem. A juventude de todos os setores políticos da Venezuela está ativa. Em quantos países do mundo se pode dizer isso? Que a juventude (estou falando de adolescentes, dos que estão entrando na universidade) quer participar da política, da construção do seu país? Isso a maior parte dos governos do mundo não podem dizer. É isso que Chávez está conseguindo com essa revolução, é esse ânimo para melhorar seu país, seja qual for a orientação política. Então, para mim, essa é a conquista principal.