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A recente decisão do Jurado de Acusação de Magistrados (JEM) do Paraguai de processar os juízes Emiliano Rolón e Arnaldo Martínez Prieto – por terem revogado a sentença dos 11 camponeses condenados pelo massacre de Curuguaty – volta a mobilizar o país vizinho contra a vergonhosa manipulação do judiciário pelos grandes latifundiários.
Leonardo Wexell Severo
A denúncia contra os dois magistrados foi formulada pela procuradora geral do Estado, Sandra Quiñónez, sob a alegação de “mal desempenho em suas funções”. Uma vez anunciada a absolvição dos camponeses presos políticos de Curuguaty, a procuradora ameaçou os juízes de que seriam ativados “todos os mecanismos legais” para que seu comportamento não ficasse impune.
Sandra Quiñónez, marionete dos latifundiários |
Também perdendo a compostura, o promotor Jalil Rachid – filho de Blader Rachid, ex-presidente do Partido Colorado, do ditador Alfredo Stroessner (1954-1989) -, qualificou a libertação dos camponeses de “canalhice jurídica”. Boa parte da acusação aos camponeses foi orquestrada pela sua batuta criminosa, que convocou 240 testemunhas, a grande maioria agentes do Estado, dependentes do Ministério do Interior e do vice-Ministério de Segurança Interno, que a partir de 2016 passou a ser dirigido por Jalil. Após ter omitido informações, fabricado declarações e feito sumir provas, foi devidamente premiado.
Juiz Arnaldo Prieto está processando Quiñónez |
A reação contra a farsa montada pela Procuradoria Geral do Estado – e acatada pelo Jurado de Acusação – foi imediata. Como membro da Terceira Sala de Apelação no Civil e Comercial e integrante da Sala Penal do Supremo Tribunal de Justiça na causa, Arnaldo Prieto decidiu processar Sandra Quiñónez e propor sua inabilitação por estar agredindo a Constituição “ao atentar contra a independência do poder judiciário”, “em vez de velar pelo respeito dos direitos e garantias nela estabelecidos”.
Instrutores militares desfilando no Paraguai: tragédia anunciada |
No dia 15 de junho de 2012, em Marina Kue, Curuguaty, 324 policiais fortemente armados com fuzis, cavalos, escudos e até helicóptero cercaram um assentamento com menos de 60 camponeses – metade deles mulheres, crianças e idosos. A ação de franco-atiradores do Grupo Especial de Operações (GEO) – treinado por militares estadunidenses e por técnicos da CIA – causou a morte de seis policiais e 11 trabalhadores rurais. O rio de sangue derramado, devidamente canalizado pela mídia, levou à derrubada do presidente Fernando Lugo uma semana depois. Tudo para que 2,5% dos proprietários, donos de 85% das terras cultiváveis, 94% delas destinadas à exportação, sigam mandando e desmandando no país que alimenta 60 milhões de pessoas no planeta, enquanto oficialmente quase um terço da sua população de 6,7 milhões passa fome.
José Gil Ojeda: querem encobrir os culpados |
Para José Gil Ojeda, veterano dirigente das Ligas Agrárias Cristãs do Paraguai, preso e exilado pela ditadura de Stroessner, “assim como no caso da punição aos camponeses de Curuguaty o principal foi dissuadir a luta pela reforma agrária e infundir medo, não precisa ser um profissional do direito para ver que querem transformar esses dois juízes em bodes expiatórios”. “Tenho a convicção de que desde que Sandra Quiñónez foi nomeada, antes até, já havia este plano. Foi nomeada procuradora geral por quem elaborou o plano de processar e condenar os juízes, pois queriam uma revanche contra o triunfo que obtivemos com a nulidade do julgamento. Diante disso, sabemos perfeitamente que não economizarão argumentos falsos, que buscarão validar com sua influência jurídica”, destacou. Da mesma forma, explicou, “Jalil Rachid foi escolhido a dedo e definido de antemão para encobrir os verdadeiros culpados e seus crimes”.