No tumultuado encerramento de campanha, em Córdoba, o candidato ultraneoliberal à presidência da Argentina justificou a presença na cidade, lembrando que seu cachorro morto, que orienta seus passos, nasceu ali
Leonardo Wexell Severo, de Buenos Aires-Argentina para a ComunicaSul*
“Temos que pensar se queremos uma tirania das maiorias, isto é o populismo peronista ou voltar a abraçar a liberdade”, vociferou Javier Milei, o candidato neofascista à presidência da Argentina, no esvaziado comício de encerramento de campanha nesta quinta-feira (16), em Córdoba. Em poucos minutos o ultraneoliberal explicitou a sua essência: das mentirosas palavras até a mais grotesca falsificação das imagens.
Conforme Milei, “a seguridade Kirchnerista – a dos presidentes Néstor (2003-2007) e Cristina Kirchner (2007-2015) – nos levou à pior miséria do planeta e quer nos reduzir à segurança das cavernas”. “O liberalismo é o respeito irrestrito ao projeto de vida do próximo, baseado no respeito à propriedade privada, aos mercados livres de intervenção estatal”, assinalou o oposicionista, frisando que é contra garantir ao Estado a capacidade de investir e fazer justiça social, pois isso leva à ditadura imposta pelas multidões. Segundo ele, “para crescer”, é preciso um país castrado de regras e direitos, com sinal verde à exploração.
Daí seu proselitismo em favor da privatização e da desnacionalização dos setores estratégicos, chegando ao cúmulo do alucinado “compromisso com a dolarização e com a extinção do Banco Central”. Condenada por economistas e de forma unânime por organizações empresariais e de trabalhadores, a negação da moeda nacional reduziria a Argentina a um mero apêndice da economia estadunidense.
Incomodado com os símbolos estampados nas cédulas argentinas, que cultuam patriotas como Evita Perón, a campanha de Milei distribuiu entre seus apoiadores imensos cartazes de notas de cem dólares, com a própria foto no centro.
Sobre o fato de finalizar a campanha na cidade explicou: “Conan [seu cão e guia] era cordobês”. De acordo com Milei, seu “filho de quatro patas”, o mastim inglês Conan não só lhe dá orientações por meio de uma médium, ao ver o futuro e aprender com os erros, mas lhe garante estabilidade com os descendentes clonados. Um deles tem o nome de Milton Friedman, o economista defensor da tese do governo mínimo e da exploração máxima.
O candidato defensor da venda de órgãos se comprometeu a apagar a história de “verdade, memória e justiça”, marco que colocou a Argentina à frente na luta pelos direitos humanos no continente ao punir os responsáveis pelo assassinato e desaparecimento de 30 mil ativistas sociais durante a ditadura militar dos anos 70.
15 mil viraram “multidão”
A divulgação da “multidão” resultou igualmente numa catástrofe, pois foi prontamente desmentida. O evento ocupou um pouco mais do que uma quadra, avaliado pela polícia em 15 mil pessoas. Isso obrigou a campanha a divulgar outra foto, de uma marcha LGBT realizada recentemente na cidade, muito maior, como se fosse o ato de encerramento.
“Chega de notícias falsas, desinformação e lixo viralizado. As mesmas pessoas que dizem que nos odeiam usam a foto da histórica marcha de 11 de novembro passado para sua campanha fantasma”, rebateram os organizadores da marcha LGBT. De forma enfática, expressaram “o mais enérgico repúdio à utilização da nossa manifestação para capitalizar politicamente um apelo que não era logicamente o esperado para o encerramento da campanha a nível nacional”.
Como foi captado pelo canal C5N, entre gritos e empurrões, nem bem terminou o ato houve um enfrentamento entre o deputado eleito, Oscar Zago, e o “youtuber financeiro” Ramiro Marra, candidato derrotado à chefia do governo da Cidade Autônoma de Buenos Aires (CABA). O responsável pela estratégia de comunicação da campanha nas redes sociais, Fernando Cerimedo, e o jovem ativista e tiktoker Iñaki Gutiérrez também puderam ser vistos no cenário bizarro. Policiais precisaram interferir para dispersar o tumulto, que causou um impacto negativo pelo ridículo.
Massa rebate retrocesso e defende união pela pátria
Na mesma quinta-feira, o candidato Sérgio Massa, da União pela Pátria, realizou dois atos de encerramento: um com estudantes e outro com empresários do Conselho Interamericano de Comércio e Produção (Cicyp), onde defendeu o papel do investimento público para a multiplicação de obras e empregos, e combateu a dolarização.
“Não ter moeda, não ter uma política de crédito, não ter autoridade monetária está condenando a indústria argentina ao fracasso e a um processo de fechamento definitivo”, apontou Massa. Conforme o atual ministro da Economia, seu mandato será de “unidade nacional”, priorizando o desenvolvimento e a justiça social.
“Nos países mais desenvolvidos, em média 92% do investimento em infraestrutura é feito pelos Estados e não pelo setor privado”, afirmou Massa, destacando que é esse o ritmo que advoga para o próximo governo. “Isso tem a ver com a perspectiva de desenvolvimento que um país deve ter”, frisou.
Ao finalizar a caminhada peronista junto aos estudantes na Escola Superior de Comércio Carlos Pellegrini, da Cidade de Buenos Aires, Massa exaltou a que defendam seus projetos com esperança e luta e assumiu “a responsabilidade de deixar para vocês um país muito melhor”. Propondo aos jovens que defendam suas utopias, frisou que a maior delas é “a liberdade de escolher onde estudar sem que ninguém lhes dê cheque ou voucher; de trabalhar onde quiserem sem que ninguém tire os seus direitos”. Acima de tudo, frisou, “a liberdade de ter um modelo de desenvolvimento para o seu país sem que ninguém coloque em primeiro lugar uma bandeira estrangeira e defenda a igualdade de oportunidades”.
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