Representantes católicos, protestantes, metodistas, islâmicos, budistas e menonitas divulgaram manifesto contra o terrorismo de Estado e em defesa do processo democrático na Colômbia
FELIPE BIANCHI E LEONARDO WEXELL SEVERO/COMUNICASUL*
Na reta final para as eleições presidenciais de 29 de maio, o povo colombiano se vê aterrado diante da política de terrorismo de Estado e da multiplicação de assasinatos de lideranças sociais, que tenta perpetuar um modelo de dominação e exclusão. O combate à injustiça e a denúncia da escalada da violência fez com que representantes católicos, protestantes, metodistas, islâmicos, budistas e menonitas se unissem nesta quinta-feira (19), em Bogotá, em um clamor pela paz e pelo respeito ao processo democrático.
Para Luis Fernando Sanmiguel, pastor da Igreja Comunidade Esperança, é preciso dar um salto de qualidade no trabalho “para ir além das paredes e dos templos, entre todos os que creem na caminhada rumo a um mundo melhor”. Mas é preciso tomar uma decisão, alertou o reverendo, “e acompanhar os movimentos sociais, que de forma pacífica defendem a vida, o que existe de mais sagrado”.
“Temos que promover a prática da reconciliação, o que exige falar sobre a verdade. O povo, para reconciliar-se, para reencontrar-se consigo mesmo, precisa saber por que assassinaram dez mil jovens como ‘falsos positivos’? Por que matam um líder social todos os dias em nosso país? Por que é preciso que 30 dos 50 milhões de colombianos necessitem viver na pobreza? Por que seis milhões de colombianos hoje não têm o que comer? Precisamos do perdão acompanhado da verdade, a verdade acompanhada da conversão e a conversão acompanhada da não-repetição”, acrescentou Sanmiguel, que também é coordenador da Comunidad de Fe – Teusaquillo Território de Paz.
Infelizmente, ressaltou o líder católico Fernando Díaz, da Igreja de Guadalupe, esta não é a compreensão de setores elitistas que estão empenhados em que nada mude e por isso mesmo “se escudam na manutenção das bases militares estadunidenses em solo colombiano, numa completa dependência do estrangeiro que só é lucrativa para as oligarquias”. “A Associação Nacional de Empresários da Colômbia (Andi) tem uma posição clara, pronunciada: ‘Vamos defender este modelo de desenvolvimento’, dizem. Que desenvolvimento? Este modelo é mineral extrativista. Vai contra todos os movimentos ambientais do país. Eles estão convencidos de sua fé mercantil e política. Para eles, não interessa se isso vai causar mais 50, 60, 100 anos de violência estrutural. ‘Não vamos permitir que um sistema comunista invada nosso país’, é o que dizem eles”, condenou Fernando Díaz.
“Essa gente faz uma interpretação da Bíblia muito conveniente para seus interesses. São muito generosos. Segundo a leitura deles, Jesus Cristo e a Bíblia garantem que é justificada a repressão e a violência contra aqueles que se atrevem a questionar a ordem e a institucionalidade deles”, relatou o líder católico. “É essa a posição da elite colombiana diante das eleições de 29 de maio. E quando falamos da elite colombiana, falamos do sistema financeiro, do sistema militar e, é preciso dizer, também de sistemas religiosos, que envolvem igrejas com grandes estruturas financeiras e enormes quantidades de terra no país”, enfatizou.
De acordo com Nathaly Andrea Ospino, da Igreja Colombiana Metodista, é preciso ter uma atenção especial à questão das mulheres, com um acompanhamento mais próximo das suas realidades, diante do crescimento das adversidades. “Desde a situação das famílias que vêm sendo empobrecidas, pois o pescador que teve o rio contaminado por mercúrio já não tem fonte de renda, até as meninas que estão sendo estupradas pelo Exército”, assinalou.
Conforme o pastor budista Dairen Jácome, a relevância da reunião é que “por diferentes caminhos todos buscamos a paz, a harmonia, a verdade e a justiça”. Mais do que nunca neste momento, frisou, “é hora de todos os líderes religiosos, comunitários, sociais, indígenas, se somarem e ensinarem por meio de nossas próprias ações como deve ser feito o combate à corrupção”.
“A palavra Islã, em árabe, deriva do conceito de paz. Nós, muçulmanos, somos buscadores da paz. Na Colômbia, em tempos de eleições, é isso o que nossa comunidade busca. Que entre toda a sociedade colombiana, entre todas as religiões e todas as raças, nos unamos e busquemos uma mudança. Que o candidato que for eleito presidente trabalhe por uma sociedade melhor”, declarou Sheij Mohammad Husein Valencia Montaño, do Centro Cultural Islamico Ahlul-bait. “Nós, da comunidade islâmica”, recordou, “trabalhamos com temas culturais e sociais, em parceria com comunidades cristãs. Temos escolas e nos unimos com a diversidade, pois não tentamos converter pessoas, mas sim cultivar a fé. Por isso, esperamos que toda a comunidade colombiana atenda ao chamado de irmos às urnas em paz”.
Por sua vez, Carlos Eduardo Guevara Rodriguez, representante da Igreja Episcopal Anglicana, relembrou que o dia 19 de maio é o Dia Nacional contra a Impunidade na Colômbia. “Mas quantas vezes crianças, jovens, líderes camponeses e Indígenas, mulheres e homens que trabalham e lutam pela terra, foram assassinados e, mediante o silêncio do Executivo, foram vítimas também da impunidade?”, questionou.
“O Poder Executivo silencia. O Poder Legislativo, o acompanha. E o Poder Judicial emite sentenças a favor dos poderosos em nosso país”, opinou. “Se Jesus Cristo estivesse aqui, no meio de nós, o que ele faria com esta Colômbia? O que ele nos diria? ‘Fiquem aí caladinhos que tudo está bem’? Ou nos chamaria à comoção para denunciarmos toda esta situação de miséria, indignidade, corrupção, impunidade e mentiras? É nosso dever trabalhar pelos mais empobrecidos, pelos mais indignados, pelos que estão destruídos e sem voz”, salientou Guevara. “Precisamos acolher essas pessoas e cuidar de nossa casa comum. Todas as vidas são importantes. Temos de valorizar e defender a vida, mas a vida com dignidade”, concluiu.
O encontro foi acompanhado por Francisco Maltés, presidente da Central Unitária de Trabalhadores (CUT) da Colômbia, que enalteceu a iniciativa dos religiosos por somarem esforços na construção de uma cultura de paz e respeito mútuo.
Leia a íntegra do manifesto traduzido para o português:
O Senhor mediará entre as nações e resolverá os conflitos internacionais. Eles forjarão suas espadas em enxadas e suas lanças em foices. Não brigarão mais povo contra povo, nem seguirão treinando para a guerra. Isaías 2:4
Considerando que as Comunidades de Fé e das Espiritualidades têm sua razão de ser na missão de levar a Paz Integral de Deus a toda a humanidade e a toda sua criação. Que as Comunidades de Fé das Espiritualidades têm como propósito zelar e defender a vida. Que as Comunidades de Fé e das Espiritualidades buscam concretizar o cuidado da criação como vida em abundância para todos os seres viventes. Que na Colômbia, no que já transcorreu do ano de 2022 e principalmente neste mês de maio, a violência aumentou em níveis preocupantes. Que no país todo está sendo gerado, de forma perversa, um ambiente para polarizar ainda mais a nossa sofrida sociedade. Que há manifestações políticas e dos poderes ameaçando o processo democrático e a institucionalidade colombiana.
Como Comunidades de Fé e das Espiritualidades fazemos um chamado a:
- Que se respeite o processo eleitoral, sem que se promova nenhum tipo de violência ou corrupção, como um exercício de construção democrática que fortaleça as instituições do Estado colombiano;
- Que se respeite o resultado eleitoral das eleições presidenciais de 29 de maio e de um eventual segundo turno, independente de qual candidato saia vencedor.
Fazemos um chamado à população colombiana, independente de sua crença religiosa e de sua preferência política, a respeitar todas as pessoas que são candidatas à presidência da República da Colômbia e a participar massivamente nos comícios eleitorais como protesto contra a violência e como uma manifestação pacífica a favor da construção da paz.
Fazemos um chamado a todas as Comunidades de Fé e das Espiritualidades a articular forças em missão do Sagrado com o propósito de viabilizar a proposta do Reino de Deus entre todos e todas nós, reconhecendo e como as espiritualidades saudáveis devem ser, a Paz Integral e a reconciliação de toda a criação, na Colômbia e no Planeta, como nossa razão de ser.
Como Comunidades de Fé e das Espiritualidades, apoiamos a todos os governos de turno a tornarem possível a construção de um governo justo, que promova a paz e faça a opção por todos os cidadãos vulneráveis, marginalizados, pobres e empobrecidos. Que façam opção por todos os necessitados em suas diferentes formas e o cuidado da criação.
Como Comunidades de Fé e das Espiritualidades fazemos o seguinte chamado: clamamos por paz e o respeito ao processo democrático!
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Esta cobertura será feita pela Agência ComunicaSul graças ao apoio das seguintes entidades: da Associação dos/das Docentes da Universidade Federal de Lavras-MG, Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário Federal e do MPU (Fenajufe), Confederação Sindical dos Trabalhadores/as das Américas (CSA), jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Barão de Itararé, Portal Vermelho, Intersindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Sindicato dos Bancários do Piauí; Associação dos Professores do Ensino Oficial do Ceará (APEOC), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-Sul), Sindicato dos Bancários do Amapá, Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Sindicato dos Metalúrgicos de Betim-MG, Sindicato dos Correios de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp Sudeste Centro), Associação dos Professores Universitários da Bahia, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal do RS (Sintrajufe-RS), Sindicato dos Bancários de Santos e Região, Sindicato dos Químicos de Campinas, Osasco e Região, Sindicato dos Servidores de São Carlos, mandato popular do vereador Werner Rempel (Santa Maria-RS), Agência Sindical, Correio da Cidadania, Agência Saiba Mais e centenas de contribuições individuais.