Governos “socialistas” de fancaria de Alwin, Frei, Lagos e Bachelet entregaram às múltis a exploração do estratégico minério
Leonardo Wexell Severo
Cartaz de convocação do ato, na sede da CUT Chile, lembra o ex-presidente
No 46º aniversário da nacionalização do cobre, feita pelo presidente Salvador Allende em 11 de julho de 1971, dirigentes sindicais realizaram em Santiago uma convocação à “renacionalização” da mais importante riqueza mineral do país, chamada pelo ex-presidente de “o salário do Chile”.
A partir desta compreensão estratégica foi que o governo da Unidade Popular (1970-1973) fundou a Corporação Nacional do Cobre (Codelco), se contrapondo à parasitagem das estadunidenses Anaconda e Kennecot, até então as maiores usurpadoras desta riqueza.
“Como dizia Salvador Allende, a nacionalização do cobre foi nossa segunda independência econômica. Agora, este é o desafio das novas gerações, porque hoje 70% do cobre que se explora no Chile está em mãos estrangeiras, em mãos transnacionais e privadas”, denunciou Manuel Ahumada, presidente da Confederação de Trabalhadores do Cobre (CTC), em cuja sede ocorreu o ato.
Campanha mobiliza sociedade chilena
Após a derrubada de Allende, a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) pôs por terra uma a uma as conquistas do frutífero governo. Diante da crise econômica inicial, Pinochet não conseguiu em um primeiro momento abrir mão do cobre, implementando o retrocesso na Codelco apenas em 1981, quando começou o processo de “concessão” do estratégico mineral ao estrangeiro. Mas foi nos governos da “Concertação”, dos presidentes Patrício Alwin (1990-1994), Eduardo Frei (1994-2000), Ricardo Lagos (2000-2006) e Michele Bachelet (2006-2010 e 2014 até o momento), com seu Partido “Socialista” (PS) que o processo de desnacionalização foi acelerado, assinalam os economistas Orlando Caputo e Graciela Galarce. Para os dois estudiosos – Caputo foi gerente geral da Codelco durante o governo da UP e integrante do Comitê encarregado de levar adiante o processo de nacionalização – com Bachelet e o PS no poder, “o Chile continuou como o mais aplicado aluno da política neoliberal e a entregar às multinacionais a sua principal riqueza”.
INDUSTRIALIZAÇÃO
Manuel Ahumada enfatizou que é hora do país retomar em suas mãos o metal – do qual conta com 35% da produção e mais de 40% das reservas mundiais. “Devemos começar um processo de industrialização e também uma independência econômica real, que nos permita poder financiar um projeto diferente de país, com maiores benefícios sociais e maior segurança social”, acrescentou.
Neste contexto de retomada do patrimônio mineral, o líder sindical defendeu a necessidade de também nacionalizar o lítio, que junto ao cobre e à capacidade de gerar energia formaria um triângulo desenvolvimentista. “O Chile tem capacidade de gerar energia, tanto eólica como geotérmica; temos as principais reservas do mineral que conserva a energia e temos as principais reservas do mineral que transporta a energia. Então, não ver um pólo de desenvolvimento virtuoso em torno a isso é ser muito limitado ao curto prazo”, assinalou.
A presidenta da CUT Chile, Bárbara Figueroa, ressaltou que há um trabalho permanente dos sindicalistas para que “o país potencialize o desenvolvimento de seus recursos naturais para o povo”. Junto à nacionalização do cobre, assinalou, deverão ser transformadas as condições precárias de trabalho e a subcontratação. Nos últimos meses, denunciou Bárbara, tem se multiplicado no setor da mineração o número de acidentes fatais devido a mais completa falta de segurança.
Durante o ato os manifestantes recordaram a morte – que continua impune – do mineiro Nelson Quichillao, em 24 de julho de 2015, assassinado por policiais durante protesto na mina El Salvador.
Em artigo, o professor da Universidade de Santiago de Chile, José Manuel Flores Poblete, lembrou que em 2003, a Standard&Poor’s, ensalsada como “uma das classificadoras de risco mais influentes do mundo” apontava a Codelco como “a empresa líder da indústria de cobre no mundo” que se colocava “a nivel mundial entre os produtores de mais baixos custos”.
A campanha popular que denunciou em 2009 as tentativas privatizantes do então candidato Sebastião Piñera – presidente entre 2010 e 2014 -, de transferir 20% da Codelco em troca de míseros US$ 10 bilhões, frisava que “de 1971 até 2008 a estatal havia aportado mais de US$ 60 bilhões ao erário”. Tal montante, apontou, é mais do que o imposto de renda pago pela totalidade das empresas privadas de todo tipo que existem ou existiram no Chile, “incluindo os bancos, companhias de seguro, empresas mineradores, florestais, industriais, pesqueiras e outras”.
VERGONHA
Selo comemora a nacionalização em 1971
Em 2016, propagandeando uma hipotética “crise” na Codelco, o governo de Bachelet justificava um menor financiamento da educação, “devido a que o preço do cobre baixou” e por isso somente seriam repassados US$ 880 milhões de aporte. “O que é incrível e indigno”, protestou o estudioso, é que a Codelco com menos de um terço da produção chilena de cobre aportou US$ 850 milhões, enquanto o setor privado que explora dois terços do cobre aportou somente US$ 33 milhões, o que quer dizer 28 vezes menos que a Codelco”.
Com os “governos da Concertação”, o país se especializou em exportar os “concentrados de cobre, denuncia o professor José Poblete. “Hoje o grosso da exportação física do mineral está sendo realizada sob a forma de uma sub-matéria prima, com um preço determinado de forma arbitrária por sócios articulados que não é mais que um ‘preço de transferência’. Ou seja, deixam a perda no Chile e realizam seu lucro no exterior”.
Em meio à intensa luta política e ideológica com os entreguistas de plantão, os patriotas chilenos fazem ecoar as palavras de Allende quando da apresentação de sua mensagem ao Congresso: “Ao Chile convém os preços altos para as suas matérias-primas. Aos monopólios convêm preços baixos para diminuir os custos das suas siderurgias. Ao Chile convém uma maior elaboração no país, para integrar a economia nacional, alcançar uma maior ocupação, mais processos industriais, mais salários, mais tributação, mais compras no país. Aos monopólios interessa não industrializar no Chile, para que o grande valor acrescentado ao preço do metal na sua elaboração, que significa uma imensa atividade industrial e comercial e altos salários, fique na metrópole. A nós interessa cuidar da nossa reserva e tirar o proveito máximo dela, à medida que formos necessitando dela. A eles interessa levar para fora a maior quantidade de cobre, ao preço mais baixo e no menor tempo possível”.