Familiares denunciam crime como armação de Cartes
Leonardo Wexell Severo
 
A morte de oito soldados ocorrida sábado (27) em um atentado à bomba contra o caminhão em que se deslocavam no interior de Arroyito, em Concepção, cerca de 500 quilômetros ao norte de Assunção, caiu como uma luva para desviar a atenção dos escândalos que abalam o alto mando militar do Paraguai.

“O camponês não tem armas, são trabalhadores inocentes. O governo de turno é o que atua e diz que se trata de um ataque do EPP (Exército do Povo Paraguaio)”, afirmou Luis Mario Florentin, primo do subtenente Félix Fernandes, um dos militares assassinados. Conforme Florentin, liderança regional dos trabalhadores rurais, há mais do que indícios do envolvimento do governo de Horacio Cartes por detrás do sangrento episódio. “O governo é o EPP”, sentenciou.
No momento da explosão, o comando militar se encontrava sob pesado cerco, tendo de responder por atos de corrupção nas Forças de Tarefas Conjuntas (FTC) – cuja base está localizada precisamente em Arroyito – e pela espionagem ilegal realizada contra uma jornalista do ABC Color, o principal periódico do país. A própria manutenção das FTC estava sendo objeto de debate no Senado, com vários parlamentares denunciando o desperdício de dinheiro público diante de tanta ineficácia.
Conforme apurou o jornal, em 25 de fevereiro do ano passado o comandante das Forças Armadas, general Luis Garcete, assinou uma ordem determinando que os militares do Comando Operativo Conjunto (COC) fossem inseridos dentro da Forças de Tarefas Conjuntas. Ligado à Garcete, o general José Alvarenga foi mantido na chefia do Comando Logístico e na coordenação do COC. Detalhe: como integrantes da FTC, todos os militares nomeados passaram a receber um adicional de 50% que, no caso de Alvarenga, tem como base seu próprio salário de general de Brigada. Assim, Alvarenga e todos os homens ao seu dispor passaram a embolsar o generoso “plus”, com gratificações, bonificações, automóvel e chofer, entre outros benefícios, durante 17 meses sem dormir uma única noite na região. Enquanto isso, os demais membros da tropa alocados na região eram obrigados a permanecer longe de suas famílias por 35 dias ininterruptamente com, no máximo, quatro dias de licença. Denunciado o esquema, a cúpula militar decidiu agir. Montou uma enorme estrutura de espionagem para saber quem estava “passando informações ao inimigo”.
 
TERRORISMO DE ESTADO
 
Conforme Santiago Ortiz, secretário geral do Sindicato dos Jornalistas do Paraguai, a espionagem feita por militares contra uma jornalista que investigava casos de corrupção nas FTC “é um indício a mais sobre a vigência de um terrorismo de Estado que nos faz retroceder ao mais obscuro das tiranias militares”. “É um fato extremamente grave, um atentado contra a liberdade de expressão e contra todas as garantias consagradas na Constituição”, frisou.
A compra do programa espião Finfisher pelo governo paraguaio já vinha sendo denunciada pela organização Tecnologia, Educação, Desenvolvimento, Investigação e Comunicação (Tedic) por possibilitar “práticas perigosas e violatórias de direitos fundamentais”. Como alertou a advogada Maricarmen Sequera, diretora executiva da Tedic, entre outros abusos o Finfisher serve para ligar de forma remota telefones celulares que se encontram apagados, interceptar vídeochamadas através do Skype e até mesmo reconhecer teclados virtuais.

 

No início de agosto, os delegados diocesanos da Pastoral Social, comandados pelo monsenhor Juan Bautista Gavilá, alertaram para a “lista de abusos e violências cometidos durante a permanência e atuação das FTC” que, sob a justificativa da “defesa nacional e da segurança interna”, “atuam de forma prepotente, intimidando as pessoas mais humildes e as lideranças sociais” com a “militarização do Norte”. “Por que a população duvida da coordenação de mando entre policiais e militares das FTC? Por que parece que o movimento do narcotráfico está mais seguro nas zonas de controle das FTC?”, questionam.

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