Coordenador da Agência Latino-americana de Informação, Osvaldo León destaca o avanço da luta pela democratização da comunicação no Continente.
Leonardo Severo e Felipe Bianchi
O pesquisador equatoriano Osvaldo León, coordenador da Agência Latino-americana de Informação (ALAI), destacou o avanço da luta pela democratização da comunicação no Continente, onde governos populares e movimentos sociais se enfrentam aos grandes conglomerados privados de mídia para fazer avançar a liberdade de expressão.
Osvaldo León publicou recentemente o livro “Democratizar a palavra – movimentos convergentes em comunicação”. |
“Nos últimos quatro, cinco anos, conseguimos por na agenda o tema da democratização da comunicação. Em alguns países pelo lado positivo, pois são iniciativas tomadas desde os governos ou dos movimentos populares que colocaram o tema como demanda. Em outros países, simplesmente porque o consenso midiático, de Washington, que funciona muito articulado para deslegitimar essas propostas, também começa a falar mal da regulação”, afirmou León, em entrevista ao ComunicaSul neste sábado (16).
Para o coordenador da ALAI, o simples fato de as empresas privadas de mídia falarem da questão como um “problema” em países como a Colômbia ou Peru, expõe a sua defensiva diante do movimento democratizante, “fazendo com que temas antes vetados nos meios, como falar sobre a responsabilidade social da mídia, sejam debatidos”.
No Peru, ressaltou León, “quando essa mídia começa a falar contra a lei de meios, há pessoas que passam a refletir, começam a haver articulistas que dizem que esta não seria uma má ideia e que seria bom também para o seu país que houvesse medidas para normatizar e democratizar a comunicação”. “Então, se o objetivo destes meios era deslegitimar o que se faz na Argentina, fracassaram, pois ao falar do tema já estão permitindo que haja espaço para que se debata a questão”, acrescentou.
Conforme o pesquisador equatoriano, em outros países este debate tem vindo à tona ainda camuflado, via discussão sobre a mudança do padrão analógico para o digital, “onde se está tratando de passar como questão técnica algo que é essencialmente político”. Mas de toda forma, avalia, se coloca a questão da concentração em xeque.
MUDANÇA DE QUALIDADE
Neste movimento, apontou León, “há uma mudança importante de qualidade no debate sobre a democratização, porque anteriormente quem estava envolvido eram pessoas ligadas direta ou indiretamente aos meios: jornalistas, estudiosos, acadêmicos”. Hoje, assinalou, “existem cada vez mais organizações populares envolvidas, e isso é o que coloca o assunto num novo patamar e lhe dá uma consistência diferente. É o que sempre dizemos: enquanto a luta pela democratização se mantiver como bandeira de um setor isolado não vamos conseguir transcender socialmente, mas quando se converte em bandeira social, passam a ser destas lutas que ninguém para”.
No caso do Brasil, destacou o coordenador da ALAI, “o simples fato de que seja a CUT quem esteja liderando neste momento o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) não é somente uma questão simbólica, mas marca uma diferenciação”. Já na Argentina, lembrou, “são forças sociais que estão cada vez mais se envolvendo e fazendo parte de convergências entre os meios alternativos e organizações populares”.
A ALAI avalia que o movimento associativo e cooperativo, por sua amplitude, potencializam a tomada de consciência sobre a relevância do terceiro setor da comunicação, “o comunitário e popular, que está vinculado a um caráter da economia social e solidária, o que é importante inclusive para sua própria sustentabilidade”.
REFLEXÃO QUE IMPULSIONA A AÇÃO
Para contribuir com o processo de reflexão e impulsionar ações convergentes pela liberdade de expressão, relatou León, a ALAI lançou recentemente o livro “Democratizar a palavra – movimentos convergentes em comunicação”. Como o movimento pela democratização se expandiu, destacou, suas ações merecem ser “reunidas e publicadas, porque até agora apenas tem sido divulgadas questões legais e oficiais, sem que seja dado o devido espaço ao que os movimentos estão refletindo e defendendo”. Sobre isso, acredita, “praticamente não tem havido uma socialização“.
A intenção da publicação é a de recolher, de alguns países chaves, propostas que surgiram desde os movimentos e, ao mesmo tempo, reflexões que estão sendo feitas sobre comunicação, como é o caso do movimento indígena, que nos últimos anos assumiu esta luta.
O fato de que entidades como a Confederação Sindical dos Trabalhadores das Américas (CSA) tenham decidido em congresso se somar à luta pela liberdade de expressão já mostra um ”salto de qualidade”, acredita, pois servem como referência para colocar o conjunto em movimento.
DESATAR OS NÓS
A partir da crescente tomada de consciência pelo movimento popular de que este é um nó a ser desatado para o bem da democracia, avalia León, o processo ganha musculatura. “O avanço das normativas legais no Equador, Venezuela, Bolívia e Argentina, neste momento, tem a ver com a mudança de paradigmas”, opina, devido ao protagonismo da ação dos movimentos sociais que colocam a demanda da comunicação comunitária. “Até agora se pensava que o sistema de comunicação tinha unicamente duas formas de gestão, uma privada e outra pública ou estatal. A gestão estatal teve seu papel extremamente reduzido no período neoliberal, onde o espaço da gestão pública foi suprimido em favor dos parâmetros privados”. Agora, somada à defesa do campo público, coletivo, ganha força a reivindicação pelo espaço para as comunidades.
Nestes países dirigidos por governos populares, acrescentou, “se reconhece que a comunicação, sendo um bem social, tem três formas de gestão: a privada, a estatal e, no caso do Equador, chamamos comunitária, que é uma gestão de organizações sociais sem fins de lucro. Esta é uma mudança substantiva pelo paradigma que se estabelece e é um reconhecimento de três setores em igualdade de condições”. ”Isso é o que diz a constituição equatoriana. Obviamente, da letra da lei à implementação, vamos precisar de mobilização, da mesma forma como lutamos para que o terceiro setor fosse incluído”.
León lembra que o argumento usado pela oposição de direita contra a repartição do espectro entre público, privado e comunitário, era o de que não havia frequências disponíveis. Na verdade, elas existem em abundância, revelou León. E lembrou: “da mesma forma que no Brasil e em muitos países se negociava no Congresso entregando frequências aos parlamentares, a prática era comum no Equador. Era assim: Tu votas para privatizar, eu te dou umas frequências”. “O fato é que há muitas pessoas que entraram como congressistas e saíram como radiodifusores ou empresários de televisão. Já há uma auditoria determinada pela nova Constituição, que estabelece que cerca de um terço das frequências concedidas são ilegais. A luta neste momento é que quando se aprove a lei, se exija o acatamento da auditoria e se redistribua. Dessa forma mais de 300 frequências irão diretamente ao setor comunitário, assim como está proposto na Constituição”.
O coordenador da ALAI acredita que esta é uma “questão medular, porque modifica a estrutura em termos de propriedade”. A segunda questão, apontou, “é que também está sendo mudada a percepção patrimonial que até agora tem prevalecido entre os concessionários de frequência. No momento em que concedem uma frequência que é de todos, ela já se converte em propriedade privada de uma casta familiar que vai herdando tudo”. O fato de que a nova legislação estabeleça que é preciso haver uma renovação aberta, pública, a cada 10 anos, “já te dá a possibilidade de romper com este critério patrimonialista”.
INCENTIVO À PRODUÇÃO NACIONAL
Da mesma forma, no caso equatoriano, há um conjunto de medidas orientadas a favorecer a produção nacional, esclareceu León, “não só no sentido de que as empresas de televisão façam produções enviando repórteres de Quito às províncias, mas no sentido de que tenha de ser das províncias a produção que alimente a programação”.
Outro ponto relevante que integra a nova lei equatoriana – a ser aprovada pelo Congresso – é o estímulo à capacidade nacional, com a obrigatoriedade de, no mínimo, 35% de produção local, defende Sally Burch, da direção da ALAI. “A decisão vai fomentar novamente a indústria musical nacional. Num primeiro momento as rádios nem conseguirão encontrar músicas suficientes para cumprir com a meta, o que exigirá um maior investimento no setor”.
Uma outra questão chave, aponta Sally, “é o limite para as frequências das concessionárias, fixado em uma emissora AM, uma FM e um canal de televisão a nível nacional”, desconcentrando o atual latifúndio midiático, uma vez que, “neste momento, há concessionárias com 50 frequências”. Há também a questão das repetidoras, que não estão proibidas, mas que ficarão secundarizadas, pois “se dá prioridade aos pedidos locais”.
Para o coordenador da ALAI, o simples fato de as empresas privadas de mídia falarem da questão como um “problema” em países como a Colômbia ou Peru, expõe a sua defensiva diante do movimento democratizante, “fazendo com que temas antes vetados nos meios, como falar sobre a responsabilidade social da mídia, sejam debatidos”.
No Peru, ressaltou León, “quando essa mídia começa a falar contra a lei de meios, há pessoas que passam a refletir, começam a haver articulistas que dizem que esta não seria uma má ideia e que seria bom também para o seu país que houvesse medidas para normatizar e democratizar a comunicação”. “Então, se o objetivo destes meios era deslegitimar o que se faz na Argentina, fracassaram, pois ao falar do tema já estão permitindo que haja espaço para que se debata a questão”, acrescentou.
Conforme o pesquisador equatoriano, em outros países este debate tem vindo à tona ainda camuflado, via discussão sobre a mudança do padrão analógico para o digital, “onde se está tratando de passar como questão técnica algo que é essencialmente político”. Mas de toda forma, avalia, se coloca a questão da concentração em xeque.
MUDANÇA DE QUALIDADE
Neste movimento, apontou León, “há uma mudança importante de qualidade no debate sobre a democratização, porque anteriormente quem estava envolvido eram pessoas ligadas direta ou indiretamente aos meios: jornalistas, estudiosos, acadêmicos”. Hoje, assinalou, “existem cada vez mais organizações populares envolvidas, e isso é o que coloca o assunto num novo patamar e lhe dá uma consistência diferente. É o que sempre dizemos: enquanto a luta pela democratização se mantiver como bandeira de um setor isolado não vamos conseguir transcender socialmente, mas quando se converte em bandeira social, passam a ser destas lutas que ninguém para”.
No caso do Brasil, destacou o coordenador da ALAI, “o simples fato de que seja a CUT quem esteja liderando neste momento o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) não é somente uma questão simbólica, mas marca uma diferenciação”. Já na Argentina, lembrou, “são forças sociais que estão cada vez mais se envolvendo e fazendo parte de convergências entre os meios alternativos e organizações populares”.
A ALAI avalia que o movimento associativo e cooperativo, por sua amplitude, potencializam a tomada de consciência sobre a relevância do terceiro setor da comunicação, “o comunitário e popular, que está vinculado a um caráter da economia social e solidária, o que é importante inclusive para sua própria sustentabilidade”.
REFLEXÃO QUE IMPULSIONA A AÇÃO
Para contribuir com o processo de reflexão e impulsionar ações convergentes pela liberdade de expressão, relatou León, a ALAI lançou recentemente o livro “Democratizar a palavra – movimentos convergentes em comunicação”. Como o movimento pela democratização se expandiu, destacou, suas ações merecem ser “reunidas e publicadas, porque até agora apenas tem sido divulgadas questões legais e oficiais, sem que seja dado o devido espaço ao que os movimentos estão refletindo e defendendo”. Sobre isso, acredita, “praticamente não tem havido uma socialização“.
A intenção da publicação é a de recolher, de alguns países chaves, propostas que surgiram desde os movimentos e, ao mesmo tempo, reflexões que estão sendo feitas sobre comunicação, como é o caso do movimento indígena, que nos últimos anos assumiu esta luta.
O fato de que entidades como a Confederação Sindical dos Trabalhadores das Américas (CSA) tenham decidido em congresso se somar à luta pela liberdade de expressão já mostra um ”salto de qualidade”, acredita, pois servem como referência para colocar o conjunto em movimento.
DESATAR OS NÓS
A partir da crescente tomada de consciência pelo movimento popular de que este é um nó a ser desatado para o bem da democracia, avalia León, o processo ganha musculatura. “O avanço das normativas legais no Equador, Venezuela, Bolívia e Argentina, neste momento, tem a ver com a mudança de paradigmas”, opina, devido ao protagonismo da ação dos movimentos sociais que colocam a demanda da comunicação comunitária. “Até agora se pensava que o sistema de comunicação tinha unicamente duas formas de gestão, uma privada e outra pública ou estatal. A gestão estatal teve seu papel extremamente reduzido no período neoliberal, onde o espaço da gestão pública foi suprimido em favor dos parâmetros privados”. Agora, somada à defesa do campo público, coletivo, ganha força a reivindicação pelo espaço para as comunidades.
Nestes países dirigidos por governos populares, acrescentou, “se reconhece que a comunicação, sendo um bem social, tem três formas de gestão: a privada, a estatal e, no caso do Equador, chamamos comunitária, que é uma gestão de organizações sociais sem fins de lucro. Esta é uma mudança substantiva pelo paradigma que se estabelece e é um reconhecimento de três setores em igualdade de condições”. ”Isso é o que diz a constituição equatoriana. Obviamente, da letra da lei à implementação, vamos precisar de mobilização, da mesma forma como lutamos para que o terceiro setor fosse incluído”.
León lembra que o argumento usado pela oposição de direita contra a repartição do espectro entre público, privado e comunitário, era o de que não havia frequências disponíveis. Na verdade, elas existem em abundância, revelou León. E lembrou: “da mesma forma que no Brasil e em muitos países se negociava no Congresso entregando frequências aos parlamentares, a prática era comum no Equador. Era assim: Tu votas para privatizar, eu te dou umas frequências”. “O fato é que há muitas pessoas que entraram como congressistas e saíram como radiodifusores ou empresários de televisão. Já há uma auditoria determinada pela nova Constituição, que estabelece que cerca de um terço das frequências concedidas são ilegais. A luta neste momento é que quando se aprove a lei, se exija o acatamento da auditoria e se redistribua. Dessa forma mais de 300 frequências irão diretamente ao setor comunitário, assim como está proposto na Constituição”.
O coordenador da ALAI acredita que esta é uma “questão medular, porque modifica a estrutura em termos de propriedade”. A segunda questão, apontou, “é que também está sendo mudada a percepção patrimonial que até agora tem prevalecido entre os concessionários de frequência. No momento em que concedem uma frequência que é de todos, ela já se converte em propriedade privada de uma casta familiar que vai herdando tudo”. O fato de que a nova legislação estabeleça que é preciso haver uma renovação aberta, pública, a cada 10 anos, “já te dá a possibilidade de romper com este critério patrimonialista”.
INCENTIVO À PRODUÇÃO NACIONAL
Da mesma forma, no caso equatoriano, há um conjunto de medidas orientadas a favorecer a produção nacional, esclareceu León, “não só no sentido de que as empresas de televisão façam produções enviando repórteres de Quito às províncias, mas no sentido de que tenha de ser das províncias a produção que alimente a programação”.
Outro ponto relevante que integra a nova lei equatoriana – a ser aprovada pelo Congresso – é o estímulo à capacidade nacional, com a obrigatoriedade de, no mínimo, 35% de produção local, defende Sally Burch, da direção da ALAI. “A decisão vai fomentar novamente a indústria musical nacional. Num primeiro momento as rádios nem conseguirão encontrar músicas suficientes para cumprir com a meta, o que exigirá um maior investimento no setor”.
Uma outra questão chave, aponta Sally, “é o limite para as frequências das concessionárias, fixado em uma emissora AM, uma FM e um canal de televisão a nível nacional”, desconcentrando o atual latifúndio midiático, uma vez que, “neste momento, há concessionárias com 50 frequências”. Há também a questão das repetidoras, que não estão proibidas, mas que ficarão secundarizadas, pois “se dá prioridade aos pedidos locais”.
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