População está mobilizada contra as Administradoras de Fundos de Pensão |
Leonardo Wexell Severo
Somente nos três primeiros meses do ano, as Administradoras de Fundos de Pensão (AFP), que controlam o sistema de capitalização chileno, lucraram US$ 196 milhões, um aumento de 100,1% (cem vírgula um por cento!) em relação ao mesmo período de 2018, com ganhos diários de US$ 2,17 milhões.
No ano passado, este mesmo cancro especulativo repassou tão somente 2% como “rentabilidade” às aposentadorias dos trabalhadores, pagando benefícios 80% inferiores ao salário mínimo, 44% abaixo da linha da pobreza.
Ao mesmo tempo em que as AFP multiplicaram seus lucros, advertiu o economista Marco Kremerman, representante da Fundação Sol, 50% dos aposentados que ingressaram no sistema em março estão recebendo benefícios inferiores a US$ 66,00. Isso tudo, vale lembrar, num país em que pipocam os casos de suicídio de idosos, que passam a ganhar espaço mesmo na mídia conservadora, e onde o número de anciãos morando nas ruas cresce a olhos vistos.
Conforme estudo da prestigiada Fundação, o lucro da gigantesca estadunidense AFP Habitat variou 68,1%, obtendo US$ 55 milhões no trimestre, o equivalente a US$ 602,5 mil diários, enquanto a também norte-americana ProVida (MetLife), alcançou 234,1%, com ganhos de US$ 45,2 milhões, US$ 502 mil diários. O percentual da italiana Plan Vital foi ainda mais obsceno: 802,5%, abocanhando US$ 13,9 milhões de lucro, US$ 150,27 mil diários.
As fórmulas de achaque utilizadas pelas AFP contra as vítimas do seu mercado cativo foram elaboradas pelos Chicago boys após o assalto ao Palácio de la Moneda pelo genocida Augusto Pinochet, com a derrubada do presidente Allende, e vitaminadas pelos sucessivos governos neoliberais. O poder econômico conferido pela privatização do sistema previdenciário lhes rendeu cadeira cativa na sala do poder político. Com a certeza de estarem blindadas pela lógica da “socialização dos lucros e privatização dos prejuízos”, sob o manto da impunidade, se lançaram aos mais descabidos desvarios. E crimes.
“Para capturar este montante absurdo de recursos, que é totalmente questionável, a Plan Vital, que cobrava uma comissão de 0,44% dos trabalhadores que ingressavam no mercado de trabalho, multiplicou da noite para o dia esta comissão duas vezes e meia, subindo para 1,16%. São cifras siderais de uma indústria imoral que se beneficia com as poupanças dos nossos idosos”, sintetizou o coordenador do movimento Não Mais AFP (No+AFP), Luis Mesina.
MONTANHA DE DÓLARES
As AFP estão sob controle dos grandes grupos financeiros internacionais |
“Vale destacar que, atualmente, as AFP estão administrando cerca de US$ 220 bilhões, o equivalente a 75% do Produto Interno Bruto (PIB) do país”, assinalou Marco Kremerman. Manejando o grosso desta montanha de dólares, as três principais AFP são estadunidenses: Habitat, US$ 57,7 bilhões; Provida, US$ 53 bilhões; e Cuprum, US$ 41,1 bilhões. A seguir vem a Capital, com US$ 40,6 bilhões, e a Plan Vital, com US$ 7,2 bilhões. Única chilena, a Modelo administra US$ 10,6 bilhões.
Reduzindo os benefícios a tão somente 30% do último salário dos homens e 25% do das mulheres, o sistema de capitalização chileno, que o ministro Paulo Guedes quer a todo custo implantar no Brasil, equivale a um jogo de cartas marcadas, para deleite das grandes companhias especuladoras, fundamentalmente estrangeiras.
Na avaliação de Marco Kremerman, “os números da concentração e da desigualdade falam por si e demonstram que a capitalização e o seu sistema de contas individuais é inviável e fracassou socialmente”. “A quantidade de pessoas que não conseguem quitar suas dívidas é extremamente alta na terceira idade fazendo com que muitos aposentados, por conta dos baixos benefícios, precisem continuar trabalhando”, acrescentou.
“Neste momento, o Congresso está discutindo um projeto de reforma previdenciária proposto pelo governo de Sebastián Piñera, que é totalmente contrário ao nosso, pois busca manter um negócio espúrio, transferindo ainda mais recursos, cerca de 40%, para estes fundos especulativos. Portanto, é nossa obrigação exigir dos deputados rechaçar qualquer tentativa de prosseguir neste descaminho”, frisou Luis Mesina. De acordo com o dirigente, “acabar com as AFP é possível e, para isso, é necessário pressionar os parlamentares que votam permanentemente a serviço das grandes corporações para que fiquem ao lado das grandes maiorias e não se submetam à chantagem do governo”.